sexta-feira, 15 de maio de 2015

No âmbito da comemoração do Dia Mundial do Livro e do Direito de Autor...Professora Alexandra Linares



Quando era miúda, a minha mãe chamava-me a “papa-livros”, porque havia alturas em que um livro de 200 e tal páginas “desaparecia” numa tarde. Claro que não os papava mesmo… Não era um monstro-das-bolachas-versão-paixão-pela-celulose-nham-nham! Mas, sobretudo nas “férias grandes”, era capaz de ler uma aventura da Patrícia ou um livro da Condessa de Ségur ou, mais tarde, um dos da Daniela sabe o que quer em meia dúzia de horas. E no dia seguinte queria ir outra vez à única papelaria da vila onde morava comprar outro!
                A certa altura descobri a Biblioteca de Bucelas (onde vivia, no concelho de Loures), e foi um descanso para os meus pais – e para a economia do lar! Li tudo da coleção Anita (sim, ANITA!, qual Martine!!!!), e todos os livros de aventuras e policiais. Tornei-me fã das grandes personagens de Agatha Christie e adorava tentar descobrir o vilão da história antes do fim do livro!
                Li tudo o que era clássico de literatura infantil, e às vezes perguntava-me se certos escritores criavam aquelas histórias macabras para causar pesadelos às criancinhas! Já viram bem a história do Capuchinho Vermelho?... Credo, que violência! O Lobo Mau come a Avozinha inteira (algo que me deixava bastante confusa…) e depois o Caçador abre-lhe a barriga, tira a Avozinha de lá “vivinha da silva”, e enche a barriga do Lobo com pedras (algo que me causava arrepios… e enquanto aquilo acontecia o Lobo dormia?!!). E o Pinóquio? Na barriga da baleia, transformado em burro, com um Grilo Falante (os de lá da terra só comunicavam por monossílabos: “cri”!)… E a Cinderela? Explorada e maltratada pela madrasta e pelas filhas dela! E no fim a Fada Madrinha, com um toque da varinha de condão, veste-a de cima a baixo como uma princesa para ela ir ao baile, e calça-a com belos sapatinhos de cristal e… Ei! Espera lá! Sapatinhos de cristal?!? Primeira coisa que me vinha à mente: aquilo tem de ser gelado e desconfortável (sapato de cristal = maleabilidade zero)!! Segunda coisa que me vinha à mente: o serviço de copos de meio-cristal da minha mãe, que apesar do “meio” sempre foi “um ver se te avias” para os tentar manter inteiros, de tão frágeis que eram! Um sapatinho de cristal assim tão resistente nunca se viu… um sapatinho de cristal que se usa para dançar e tudo e não parte… Vá lá, Fada Madrinha, conte lá: são de borracha transparente daquela das sandálias que se usavam a torto e a direito pela petizada e faziam transpirar imenso, que juntamente com o pó que ia entrando na sandália durante o recreio, faziam os pés escorregar numa espécie de lama biológica, não são? Sapatinhos de cristal… nem na Marinha Grande se faz vidro tão resistente!!! E quando chega a meia-noite? PUFF!, quebra-se o encanto! A Cinderela volta a ter o velho vestido rasgado e tal… mas o sapatinho de cristal não se transforma. Então porquê??! Tantas incongruências e questões sem resposta no mundo da literatura tradicional infantil! Bem, pode-se dizer que desde cedo os livros ajudaram e muito a formar o meu espírito crítico e a desenvolver a minha capacidade de raciocínio…
                Tantos livros me passaram pela mão, desde banda desenhada (A turma da Mônica, Tio Patinhas, Mickey e companhia…), livros de aventuras, policiais, alguns romances, livros de poesia, enciclopédias, livros sobre animais e a Natureza em geral (ainda tenho muitos, entre os quais A Vida na Terra – um clássico da minha geração!!) … E muitos deles conheci-os através desse lugar mágico chamado Biblioteca. Ainda assim, confesso, levar os livros emprestados não me satisfazia a 100%. Ainda hoje sou uma pessoa que gosta do cheirinho dos livros novos e de ser eu a fazer o primeiro passeio por entre as páginas nunca antes mexidas. E gosto de os ter. Nunca deito livros fora, e sou muito apegada a eles – dificilmente ofereceria um meu livro a alguém. Lembro-me que ficava horrorizada quando via nos livros que trazia da biblioteca uma página rasgada, ou escrita, ou riscada! O cartão de leitor foi dos primeiros que tive na vida, muitos antes de ter um Bilhete de Identidade, que teve de esperar até ir para o 5º ano!
                Da minha infância e adolescência ainda tenho uma vintena de livros. Incluindo manuais escolares! A essas “preciosidades” juntaram-se há uns anos umas outras, bem mais preciosas: os livros da juventude da minha mãe! Quando os meus pais mudaram de casa, a minha mãe perguntou-me se não os queria “lá no escritório”. Claro que queria!!! São mais de cem livros de autores portugueses e estrangeiros. Os mais novos devem ter uns 30 anos ou mais! Os mais antigos já têm para cima de meio século, páginas amarelecidas, a cheirar um pouco a mofo… mas são uma delícia!
                Quais e-books e e-readers, quais carapuça! Não há sensação no mundo comparável à de folhear um livro e partir à descoberta do que todos aqueles simbolozinhos juntos em grupinhos maiores ou menores (as letras que formam as palavras, que formam o parágrafo, que formam o texto) querem dizer! Porque ler, ao fim e ao cabo, é um ato de magia! É ou não é? J  













No ano passado pintei o escritório… estes são alguns dos livros que lá estão, aqui empilhados noutro quarto…




Os “sapatinhos de cristal” tal como imaginava que eram realmente!




Ler

Ler é viajar em low-cost
E ao mesmo tempo em primeira-classe,
Voar alto, mesmo sem asas,
Sentir o íntimo a transformar-se…
É libertar a imaginação,
É envolver-se e rir e chorar,
E ver com o coração
O que quem não lê não consegue enxergar.
E é teleportar-se para outros mundos,
Conhecer seres bem intrigantes,
É lembrar-se da nossa pequenez
Ou fazer-nos sentir gigantes.
É deslindar crimes e mistérios,
É perseguir bandidos e ser herói,
É ser príncipe ou princesa ou rei,
Viver outra vida que deleita ou que dói.
Ler é nadar num mar de palavras,
E deixar-se ir num remoinho de emoções,
É enriquecer e alimentar a alma,
É aprender infinitas lições!
Ler é sonhar num leito de papel,
É dar a mão ao conhecimento,
Deixar-se embalar em prosas e poesias,
Que palavras impressas não as leva o vento!
Ler, para mim, é viver!
É viver um eterno renascer,
Uma vida em que tudo é possível,
Exceto viver a vida sem ler…


Prof.ª Alexandra Linares

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